Se o dia 12 de junho de 2014 é uma data aguarda
pelos fãs de futebol, o mesmo vale para os cientistas. O pontapé inicial da
Copa do Mundo será dado por um jovem com paralisia que usará um exoesqueleto
(esqueleto externo) projetado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis.
O projeto recebeu o nome de Andar de Novo.
Quem possui um corpo sem deficiências tem os
movimentos, a ação e reação coordenados pelo sistema nervoso que emitem
comandos para os órgãos e glândulas. Quando há um problema ou um dano físico,
os sinais emitidos pelo sistema nervoso têm sua passagem interrompida. O
exoesqueleto pode reverter a situação por meio da interação
cérebro-máquina.
O exoesqueleto de Nicolelis é uma veste robótica
controlada por pensamentos. Ele funciona através de sensores que captam a
atividade elétrica dos neurônios, as células nervosas, e
transformam os pensamentos em comandos. Há outros animais que possuem esqueletos
externos (exoesqueletos), como os insetos.
Os sinais emitidos do sensor localizado no cérebro serão
transmitidos em uma unidade similar a um laptop, carregada pela pessoa em uma
mochila. O computador ainda transmitiria os sinais elétricos cerebrais,
enquanto o exoesqueleto estabiliza o corpo da pessoa e executa o comando. No
futuro, a ideia é que pacientes usem a veste como uma roupa normal, mas que
teria inúmeras funcionalidades, como o Homem de Ferro.
Segundo o neurocientista, para que o processo
funcione com sucesso, o cérebro precisa ser retreinado por meio de estímulos
que provoquem as reações necessárias para desencadear os movimentos. Em
entrevista, ele descreveu melhor como funcionará a comunicação entre
exoesqueleto e o cérebro.
“Além da veste, o exoesqueleto tem uma mochila, que
é a central de controle, que é o cérebro do exoesqueleto que vai dialogar com o
corpo do paciente. Essa central vai captar os sinais do cérebro do paciente,
traduzi-los em sinais digitais para que o exoesqueleto possa entender e receber
os sinais de feedback, que serão transmitidos de volta ao paciente. Essa veste
vai conter todos os motores hidráulicos que vão mover o exoesqueleto e as
baterias, outro componente fundamental, fornecedoras da potência para o
exoesqueleto funcionar”.
As pesquisas de Nicolelis estudam a unidade básica
funcional do sistema nervoso central como sendo uma população
difusa de neurônios que interagem em circuitos e que o cérebro funciona como
uma rede dinâmica, integrando diferentes áreas no mesmo processo.
Testes
A partir dessa ideia, foram realizados testes com
macacos rhesus. Eles receberam implantes de sensores wireless (sem fio) que
enviam informações de atividade cerebral 24 horas por dia. Em um dos
experimentos, um macaco aprendeu a jogar vídeo game com controle. Depois de um
tempo, o controle foi substituído por um braço robótico ligado aos sensores no
cérebro do macaco. Com isso, ele pode jogar usando apenas seus impulsos
elétricos.
As experiências mostraram que os macacos aprenderam
a controlar os movimentos de ambos os braços de um corpo virtual, também
chamado “avatar”, usando apenas a atividade elétrica do cérebro, comprovando a
boa interação entre cérebro-máquina.
Um dos avanços da pesquisa foi mostrar que o sistema somatossensorial, que nos permite
ter sensações em diferentes partes do corpo, pode ser influenciado pela visão.
Ou seja, a mente se mostra capaz de assimilar membros artificiais, como as
neuropróteses, como parte da própria imagem corporal.
Após a Copa, as pesquisas para aperfeiçoar o
exoesqueleto continuam, com o objetivo de levar novas possibilidades a quem
precisa de mobilidade, como deficientes físicos que sofrem de algum tipo de
paralisia ou limitações motoras e sensoriais causadas por lesões permanentes da
medula espinhal.
Outros exoesqueletos
Exemplos de exoesqueletos não faltam no mundo da
ciência. De modo geral, eles são pensados para completar a força e a mobilidade
humana. As primeiras pesquisas nos Estados Unidos, na década de 1960, eram
voltadas para o campo militar. A ideia era aumentar a capacidade de
carregamento de quem trabalhava nos navios de submarino; depois, na década
seguinte, o exoesqueleto seria pensado para equipar os homens da infantaria.
Atualmente, o Exército norte-americano trabalha na produção de um exoesqueleto
para os soldados, o que traria mais estabilidade e força, elementos vitais para
o combate.
Fora desse contexto, o primeiro projeto de um
exoesqueleto foi o SpringWalk, criado pelo pesquisador do Laboratório de
Jatopropulsão da NASA, John Dick, Califórnia (EUA), no início dos anos 1990. O
projeto de Dick cria pernas articuladas, que reduzem a força dos humanos.
Outros projetos caminham na direção do projeto de Nicolelis.
É o caso do HAL (Hybrid Assistive Limb, ou Membro Assistente Híbrido).
Desenvolvido no Japão, esse exoesqueleto pretende dar mobilidade às pernas.
Outra versão mais moderna inclui todos os membros. Quem usar a veste consegue
erguer cinco vezes mais o peso que consegue carregar. A ideia é que o HAL
melhore a mobilidade de paraplégicos e idosos e ajude trabalhadores que
precisam usar a força física a não fazê-lo em nível prejudicial.